Com os pés a
balouçar da descomunal cadeira de verga, tentava a todo o custo arrastá-la para
a frente, segurando-me ao tampo de mármore da mesa mas esbarrava quase sempre
nos seus pés, ou encalhava no empedrado do chão. Na
esplanada do Pátio das Galinhas, acabava
por beber a laranjina de joelhos no assento, até ter de ceder o meu lugar a uma
pessoa crescida. Eu cá, antes queria uma pinhoada, ou um pirulito...
Eram mornas e
descuidadas, as tardes passadas naquele pátio abrigado, entre
as fachadas caiadas, detrás do gradeamento em ferro forjado, assente num murete
de pedra. Pelo imponente pórtico de cantaria trabalhada, ornamentado com duas
lanternas, chegavam mães aprumadas com crianças vestidas de branco pela mão,
empurrando carrinhos de bebé que atravancavam a esplanada. Atrás, as avós ataviadas
apertavam as bochechas dos meninos e acenavam às primas janotas, com
exclamações afectadas.
Detrás do balcão, a máquina de café silvava, no
pátio cheirava a galões e torradas; os criados de mesa esmeravam a coreografia
num elegante volteado, alçando bandejas sobre os chapéus e penteados dos
fregueses, depondo entre eles os refrescos, batidos e pasteis, contornando
ardinas submissos e os engraxadores servilmente curvados, perante senhores
hirtos e abotoados.
Diante da entrada amontoava-se a juventude
estupenda, rapazes em trajes de ténis balouçando raquetes, espanhóis de cabelos
lustrosos e perfumados, raparigas morenas e ruidosas. Era um alegre convívio,
cena imortalizada num palco perpétuo e exíguo, onde nunca fazia calor nem frio,
maciamente abrigado de todos os ventos e marés, findas as missas e partidas de
ténis, em tardes de nortada, touros e matinée.
E no sossego e descuido em que ando agora, no meio
de estranhos, sinto-me como a criança de outrora, entre os adultos ufanos.
É um gosto ler estes "postais da infância". Mereciam ser todos publicados em livro.
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